Para o cardeal Maradiaga o arcebispo Müller “ é,
acima de tudo, um professor alemão de teologia”
Foto retirada de Religión Digital
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O cardeal Oscar Maradiaga deu uma entrevista ao
jornal alemão “Koelner Stadt-Anzeiger” em que recomenda uma maior flexibilidade
ao arcebispo Gehrard Müller, o qual tinha reproposto num artigo a doutrina que
veda a comunhão aos divorciados que se tenham voltado a casar.
Tanto um como o outro desempenham tarefas
relevantes no governo da Igreja. Maradiaga, arcebispo da capital das Honduras,
é o coordenador do grupo de oito cardeais conselheiros do Papa. Müller é o
Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé e está na lista dos futuros
cardeais.
Não se deve estranhar que, entre os colaboradores
mais próximos do Papa, haja divergência de perspetivas. O que não tem sido
muito comum é elas serem tornadas públicas no registo que o cardeal hondurenho
utilizou na entrevista. “Ele é, acima de tudo, um professor alemão de teologia;
na sua mentalidade só existe o verdadeiro e o falso. Mas eu digo, meu irmão: o
mundo não é assim; tu deves ser um pouco mais flexível”, disse.
Estas palavras de Maradiaga não terão agradado aos
que defendem um discurso único para a Igreja e preferem que os seus mais altos
dignatários falem a uma só. Mas essa não parece ser a perspetiva do Papa. Na
“Evangelii Gaudium” apresenta a Igreja como a “discípula missionária” que
precisa “de crescer na sua interpretação da Palavra revelada e na sua
compreensão da verdade”. Por isso deve acolher os contributos de diferentes
teólogos, exegetas e até peritos de outros saberes, como as ciências sociais.
“A quantos sonham com uma doutrina monolítica defendida sem nuances por todos,
isto poderá parecer uma dispersão imperfeita; mas a realidade é que tal
variedade ajuda a manifestar e desenvolver melhor os diversos aspetos da
riqueza inesgotável do Evangelho”, conclui o Papa.
Esta perspetiva “bergogliana” exigirá do Perfeito da
Doutrina da Fé uma atuação menos inquisitorial e mais flexível. Que proponha
com clareza as verdades que a fé coletiva foi consolidando ao longo do percurso
multisecular da Tradição, mas que não coarte a reflexão teológica. Quanto aos
teólogos, que desbravem caminhos novos –mas sem cederem à tentação de pretender
impô-los rapidamente aos outros fiéis.
(Texto publicado no Correio da Manhã de 24/01/2014)