quarta-feira, 27 de março de 2024

Desafio aos novos ministros

Amanhã vai ser apresentado ao Presidente da República o novo Governo, o qual será empossado em circunstâncias políticas e sociais muito particulares. Exige-se aos novos governantes capacidade de diálogo, e de gerar sinergias, para a promoção do bem comum.

Em algumas funções sociais do Estado, têm sido as Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS’s), entre as quais se incluem muitas da Igreja Católica, a garantirem várias das respostas sociais que competem ao Estado. São os casos do apoio à infância e juventude, aos idosos e aos mais desfavorecidos.

Os novos governantes não deverão olhar para as IPSS’s como concorrentes do Estado, mas como suas coadjuvantes. Devem, nomeadamente os ministros da Segurança Social e da Saúde, aproveitar as suas virtualidades, promover boas práticas, estar atentos às suas carências e acorrer às suas necessidades. Só assim estas poderão continuar a prestar um bom serviço às populações, sobretudo àquelas que o Estado tem mais dificuldade em apoiar – e com as quais teria de gastar muito mais se não fossem as IPSS’s...

Há outras áreas e contextos que também exigem atenção dos novos ministros, nomeadamente os da Educação e da Justiça, áreas em que as IPSS’s poderiam desenvolver novas respostas sociais e fazer o que o Estado não consegue. Por exemplo, a criação de estruturas de acompanhamento de alunos com baixo rendimento provenientes de contextos sociais e familiares complexos, como acontece em escolas dos subúrbios do Porto e, sobretudo, de Lisboa, ou nas zonas do interior.

A Igreja também já demonstrou competência para a criação de novas respostas sociais para a prevenção da criminalidade, a reinserção social dos reclusos e o acompanhamento dos libertos para que não voltem a reincidir.

A resolução de problemas complexos requer a colaboração de todos!

quarta-feira, 20 de março de 2024

Não vale tudo para atacar o Papa

Apesar de muitos Papas terem sido santos, todos são criticáveis. Todos são humanos e erram. O Novo Testamento regista aliás aquela que será a primeira crítica a um Papa, S. Pedro, protagonizada por S. Paulo. O autor da Carta aos Gálatas refere que Pedro estava a “comportar-se de modo condenável” (Gál 2, 11).

Paulo discordou de Pedro quando este quis impor aos gentios costumes judaicos, como a circuncisão. Denunciou a sua incoerência por comportar-se de uma forma quando estava com eles e de outra quando estavam judeus presentes. Disse-o primeiro diretamente a Pedro e só depois o escreveu.

É assim que se deve proceder em Igreja. Mesmo sujeitando-se a represálias. Deve-se ter a frontalidade e a coragem de expressar uma opinião divergente a qualquer superior hierárquico. Nunca se deve recorrer à denúncia anónima por temer que a crítica não seja bem acolhida e que as “consequências possam ser desagradáveis” para o próprio. Foi assim, porém, que um anónimo se justificou num texto em que criticou opções do Papa Francisco sem dar a cara.

O Pe. Gonçalo Portocarrero de Almada, na sua crónica no Observador, considerou esse texto “uma exaustiva radiografia do presente pontificado”, meritória “porque tanto refere aspetos positivos como negativos”. É uma conclusão curiosa, uma vez que o escrito anónimo discorre longamente sobre as críticas a Francisco, ao passo que se limita a elencar certos pontos positivos do seu pontificado

O Pe. Gonçalo reconhece que é um “sinal de cobardia” recorrer ao anonimato, mas desculpa-a por “neste caso ser, apenas, elementar prudência”. Pois, não é prudente, porque não é sério nem digno. E também não é evangélico, porque contraria os conselhos de correção fraterna dados por Jesus (Mt 18, 15-18).

A abjeção da mão escondida e a dignidade da cara descoberta não têm o mesmo valor.

quarta-feira, 13 de março de 2024

O populismo aí está com os seus pecados


Os bispos europeus estão a acordar para os perigos dos populismos da extrema-direita, ainda que estes por vezes se apresentem como paladinos de lutas como a proteção da vida ou a defesa da cultura e fé cristã.

Em 2019, a Conferência Episcopal Alemã (CEA) denunciou o “vírus do populismo” e a ameaça que ele representava. “Rejeitamos firmemente qualquer tentativa de instrumentalizar o cristianismo para fins populistas. Estamos convencidos de que a nossa fé e a nossa tradição católica, como Igreja universal, contrastam com as características peculiares do populismo. Pensemos, por exemplo, na igualdade absoluta de todos os seres humanos como criaturas de Deus”.

No ano passado o presidente da CEA, D. Georg Bätzing, numa entrevista ao jornal alemão “Bild”, afirmou que “a Igreja deve distanciar-se de todas as posições desumanas e antidemocráticas”.

D. Mariano Crociata, presidente da Comissão dos Episcopados Católicos da União Europeia (COMECE), expressava em dezembro numa entrevista à agência católica ACI a preocupação dos bispos europeus com certas dinâmicas culturais europeias, como o crescimento dos populismos. “Trata-se de fenómenos que sinalizam uma debilidade e que tornam as estruturas e a vida das democracias cada vez mais frágeis”.

Pensava-se que Portugal era imune ao populismo. Mas ele aí está, propondo falsas respostas simplistas para problemas complexos. A promover visões redutoras da sociedade, a preto e branco, colocando uns, os bons, contra os outros, os maus.

Apesar do populismo português ser atípico – pois promete dar tudo a todos para se implantar... – os cidadãos devem estar atentos às suas contradições e incoerências. Os bispos portugueses deverão estar particularmente vigilantes a toda a instrumentalização da fé – e deverão denunciar as incongruências com os valores cristãos.

quarta-feira, 6 de março de 2024

Proteger crianças melhora o futuro

O Papa e as crianças (foto Vatican Media, retirada daqui)
O Papa Francisco convocou as crianças de todo o mundo, cristãs e não cristãs, para aquela que será a Primeira Jornada Mundial das Crianças, em Roma nos dias 25 e 26 de maio. Este sábado, foi apresentado em Roma esse evento e o hino em que as crianças cantam: “Nós somos a alegria e a esperança. Somos nós a novidade do mundo”.

Nesse mesmo dia o Papa publicou uma mensagem dirigida às crianças, na qual sublinha que elas são, não só a alegria dos pais e das famílias, mas também “da humanidade e da Igreja”. Desafia-as a “sonhar uma nova humanidade e a trabalhar por uma sociedade mais fraterna e atenta à nossa casa comum”.

Apesar do tom de alegria e esperança que transparece na mensagem, o Papa pede que não sejam esquecidas “as crianças a quem, ainda hoje, é cruelmente roubada a infância”. Lembrou aquelas que lutam contra doenças, as que são forçadas a combater ou a fugir à guerra como refugiadas, as que não podem ir à escola e as que são vítimas “de grupos criminosos, das drogas ou doutras formas de escravidão, de abusos”.

O Papa não diz explicitamente, mas sabe bem que no interior da Igreja se cometeram e cometem abusos. Tal sucede num espaço que deveria ser de proteção e de promoção de uma infância feliz e harmónica, no qual as crianças pudessem dilatar todas as suas potencialidades e desenvolver, também, a sua fé.

É repugnante que esses abusos tenham acontecido numa instituição que, ao mesmo tempo, tanto tem contribuído para dar uma nova oportunidade a tantas crianças a quem foi “roubada a infância”.

Ao promover a Jornada Mundial das Crianças, o Papa quer que uma onda de esperança se inicie em Roma e contagie todo o mundo. Deseja que a Igreja se comprometa, cada vez mais, com a proteção e a promoção das crianças. Que a Igreja seja para elas um espaço para “sonhar uma nova humanidade”.