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O cardeal que veio do fim do mundo é alérgico ao ambiente
palaciano de Roma e tem denunciado, em várias circunstâncias, as doenças que contaminam
a Igreja. Neste Natal ofereceu à Cúria Romana um diagnóstico completo e
sistematizado das suas enfermidades no discurso das “tradicionais saudações”
natalícias. Um presente que não terá agradado a muitos – e que a todos os
católicos deve deixar inquietos. Pois é impossível, em tão longo elenco, não
encontrarmos alguma das nossas moléstias.
Não é preciso ser hipocondríaco espiritual para
identificar em nós próprios vários dos sintomas descritos pelo Papa, bem como
nas nossas comunidades. “Estas doenças e tais tentações são naturalmente um
perigo para todo cristão e para toda cúria, comunidade, congregação, paróquia,
movimento eclesial e podem atacar, quer ao nível individual, quer ao comunitário”.
Quem não o reconhecer, não conseguirá curar-se. O
restabelecimento, para além da ação do Espírito Santo, “é também fruto da
consciência da doença e da decisão pessoal e comunitária de tratar-se,
suportando pacientemente e com perseverança a terapia”, disse o Papa à Cúria
Romana.
O Papa Francisco, para além de ter plena consciência dos
seus males, tem a coragem de pedir desculpa aos que possa ter ofendido. No
encontro com todos os funcionários do Vaticano, que se seguiu ao da Cúria, no
final de um discurso muito mais afável que o anterior, disse de improviso: “Não
quero acabar estas palavras de felicitações sem vos pedir perdão pelas faltas,
minhas e de meus colaboradores, e também por alguns escândalos, que fazem tanto
mal. Perdoem-me”.
O Papa Francisco, a partir do centro da Igreja, está a provocar
uma verdadeira revolução coperniciana no discurso clerical. Frequentemente esse
discurso resvala para a condenação intransigente dos que vivem à margem da lei
eclesiástica ou dos organismos laicos – e resvalava, também, para a
condescendência para com os clérigos que prevaricam ou para com as instituições
católicas.
O Papa Bergoglio, pelo contrário, propõe uma mensagem de
acolhimento aos que estão distantes, sobrepondo a misericórdia à lei. E tem
palavras de rigor, e de muita exigência, para o interior da Igreja, a começar
pela Cúria. É um Papa que acolhe e que corrige.
(Texto publicado no Correio da Manhã de 26/12/2014)
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