sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Negócios sagrados

Foto retirada daqui
A Igreja testemunha desde os seus inícios a gratuidade da salvação. Na Primeira Epístola de S. Pedro pode ler-se que não fomos resgatados por “bens corruptíveis, prata ou ouro, mas pelo sangue precioso de Cristo” (1Pe. 1,18). O Papa Francisco, sucessor de Pedro, na audiência de quarta-feira recordou que não se tem de pagar para passar a Porta do Ano Santo. “A salvação não se compra. A Porta é Jesus e Jesus é grátis”.

Contudo, ao longo dos séculos, foram cometidos abusos que levaram os fiéis a crer que é preciso pagar para se salvarem. Na Idade Média, por exemplo, vendiam-se e compravam-se indulgências, que eram, então, uma das principais formas de financiamento da Igreja.

Esse “comércio religioso” fez despoletar a revolta de Lutero e esteve na génese da Reforma Protestante. O Concílio de Trento procurou corrigir essa conceção errada da salvação e determinou que as “indulgências e outros favores espirituais de que o fiel não deve ser privado” devem ser administrados de forma gratuita, “de modo que todos pudessem finalmente compreender que estes tesouros celestes foram dispensados por causa da piedade e não do lucro”. Quatro anos apenas após o encerramento deste Concílio, em 1567, o Papa Pio V foi obrigado a ser ainda mais explícito e determinou que passava a ser proibido cobrar qualquer taxa ou valor pelas indulgências.

Apesar do esforço da Igreja para expurgar a sua atividade de todo o mercantilismo, ele prevalece no seu interior. É normal as pessoas dizerem que vão pagar a missa, o batizado ou o casamento.

Para um crente esclarecido a Eucaristia e os sacramentos têm um valor infinito. Nenhum dinheiro no mundo os pode pagar. Apenas se podem aceitar ofertas que a Igreja aplica na prossecução dos seus fins. E estes são, principalmente, o “culto divino”, a “sustentação do clero e dos outros ministros”, bem como as “obras do sagrado apostolado e de caridade, especialmente em favor dos necessitados” (cân. 1254 do Código de Direito Canónico).

Ainda que no contexto de alguns sacramentos se possa receber uma oferta, não se aceita qualquer quantia pela Confissão ou pela Unção dos Enfermos para sublinhar a gratuidade da salvação. Todavia, ainda muito há a fazer para expurgar a Igreja de algum “consumismo religioso”.

(Texto publicado no Correio da Manhã de 18/12/2015)

3 comentários:

  1. Muito bem Fernando. É tempo de as pessoas e sobretudo os cristãos começarem a compreender que a salvação e gratuita. É um dom. E o dom não se compra. Recebe-se ou se acolhe. Nada mais. Continua a esclarecer toda essa gente
    Boas festas e até para o ano.

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  2. Muito bem Fernando. Parabéns e continua a esclarecer toda essa gente, cristãos e não cristãos , da gratuidade da salvação. Não é fácil deixar linguagens antigas de "pagar" missas ou outros sacramentos ou memnso promessas. Essa linguagem é muito pobre além de ser incorreta. A salvação é um DOM. E como todo o dom há que recebê-lo ou acolhê-lo. Nada mais. E acoohê-lo numa atitude de agradecimento e de alegria. É o que nos vai ser rcordado dentro de dias na liturgia de Natal: UM MENINO NOS FOI DADO. É uam oferta, um dom divino para além de qualquer merecimento. E como consequência desse dom há uma grande alergria nos céus e na Terra. Este dom divino convida-nos também a sermos generosos e a tornarmo-nos dom para outros. É também um ensinamento de Natal. Saibamos crescer em generosidade e gratuidade.

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  3. A gratuidade da salvação, sinal de Graça, dom generoso de Deus, foi motivo de separação, por oportunisticamente se tornar questão de comércio e serviços.

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