quarta-feira, 20 de novembro de 2024

Deixar a guerra para matar a fome

O presidente do Brasil, Lula da Silva, lançou oficialmente a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza na segunda-feira durante a abertura da reunião do G20, que, até ontem, decorreu no Rio de Janeiro. Para Lula da Silva “o Mundo está pior” desde a primeira cimeira dos líderes das 20 maiores economias do Mundo em 2008.

O Papa Francisco também tem procurado chamar a atenção para a pobreza no Mundo. Em 2016 criou o Dia Mundial dos Pobres, que se celebrou domingo passado. No âmbito desta iniciativa, todos os anos a Universidade de Fordham, em Nova Iorque, publica um Relatório Anual sobre a Pobreza Global baseado nos dados mais recentes de organizações internacionais fiáveis.

Este relatório propõe anualmente um índice de pobreza - que este ano se situa nos 25,8% - a que foi dado o nome de Fordham Francis Index, uma vez que se inspira na visão do Papa Francisco sobre a pobreza, não só material, mas também espiritual. Este índice considera indicadores como o acesso à água potável, a alimentação adequada, a habitação segura e o emprego, para além da educação, da igualdade de género e da liberdade religiosa.

A evolução do índice demonstra que os esforços para aliviar a pobreza se intensificaram na recuperação da pandemia, mas que agora estão a desacelerar. Isso, para o presidente Lula, exige a criação de uma aliança que ponha fim à “tragédia coletiva” que é a fome e a pobreza.

O planeta, como tem referido o Papa, tem recursos suficientes para pôr fim a esta tragédia. Contudo, enquanto for governado por insanos que preferem gastar dinheiro a fazer a guerra do que a promover o desenvolvimento dos povos, não se prevê de grande eficácia a Aliança de Lula.

A maioria dos líderes mundiais estão mais preocupados com as alianças bélicas, e em canalizar recursos para aí, do que em erradicar a pobreza.

quarta-feira, 13 de novembro de 2024

A oração alimenta a ação social


O Papa Francisco instituiu o Dia Mundial dos Pobres, que se celebrará no domingo, pela oitava vez. O tema proposto para este ano é: “A oração do pobre eleva-se até Deus” (cf. Sir 21, 5).

É natural que a frase proposta pelo Papa na mensagem deste ano para assinalar a data suscite algum ceticismo, pois não se verifica imediatamente a intervenção divina para pôr fim às situações de pobreza que se identificam perto ou longe de nós. Antes pelo contrário, vivem-se tempos em que a crise, a pandemia e as guerras têm contribuído para gerar novas bolsas de pobreza. Parece que Deus não escuta a oração do pobre.

O desafio do Papa aos crentes é que leiam o texto bíblico “nos rostos e nas histórias dos pobres que encontramos no nosso dia-a-dia, para que a oração se torne um modo de comunhão com eles e de partilha do seu sofrimento”.

O Papa pede a cada um dos crentes que reze pelas necessidades dos pobres. E que traduza a sua oração em gestos concretos de atenção aos que sofrem. Contudo, adverte o Papa, “a caridade sem oração corre o risco de se tornar uma filantropia que rapidamente se esgota”.

A Madre Teresa de Calcutá, a 26 de outubro de1985, disse na Assembleia Geral da ONU com o terço na mão: “Sou apenas uma pobre freira que reza. Ao rezar, Jesus põe o seu amor no meu coração e eu vou dá-lo a todos os pobres que encontro no meu caminho. Rezai vós também! Rezai, e sereis capazes de ver os pobres que tendes ao vosso lado. Talvez no mesmo andar da vossa casa. Talvez até nas vossas próprias casas há quem espera pelo vosso amor. Rezai, e abrir-se-ão os vossos olhos e encher-se-á de amor o vosso coração”, recordou o Papa.

A oração cristã não é uma fuga da realidade passando para Deus a responsabilidade de corrigir o que está errado. É o elemento que dá consistência à intervenção dos crentes no mundo.

quarta-feira, 6 de novembro de 2024

O Sínodo começa agora

Ao fim de três anos, encerrou-se o Sínodo sobre a sinodalidade. O resultado dessa caminhada está vertido num documento de 51 páginas que sintetiza a reflexão produzida e propõe caminhos para a implementação da sua dinâmica na Igreja.

A sinodalidade é definida em “termos simples e sintéticos” como “um caminho de renovação espiritual e de reforma estrutural para tornar a Igreja mais participativa e missionária” (nº28). Nada de novo: desde os inícios, é a forma ajustada de a Igreja funcionar em todos os seus níveis para discernir e tomar as suas decisões. Isto implica escutar e dialogar para chegar ao consenso possível.

No entanto, se o documento final for devidamente implementado, poderá significar a maior transformação na Igreja Católica desde o Concílio Vaticano II. Na verdade, muitas das suas propostas traduzem preocupações conciliares que ainda não se efetivaram, apesar de já terem passado quase 60 anos desde que se concluiu esse Concílio. Há, aliás, o risco de acontecer ao Sínodo o que aconteceu ao Concílio: o sucessor de Francisco e a sua entourage podem achar que se avançou de mais e tentarem congelar as dinâmicas que foram suscitadas na Igreja.

Podem também aqueles que têm a responsabilidade de tomar decisões – nomeadamente padres e bispos – fazerem lindos discursos sobre a sinodalidade e até adotar as estruturas de participação propostas pelo Sínodo, mas usá-las apenas para confirmarem as suas convicções ou as decisões tomadas somente por alguns. Se, como preconiza o documento, não acontecerem “mudanças concretas a curto prazo, a visão de uma Igreja sinodal não será credível e isso afastará os membros do Povo de Deus que retiraram força e esperança do caminho sinodal” (nº 94).

Que o Sínodo não seja um “sonho lindo que acabou”, mas sim o verdadeiro relançamento da participação na Igreja.

(Texto publicado no Jornal de Notícias de 06/11/2024)