sexta-feira, 24 de julho de 2015

A Igreja e o ter

Imagem retirada daqui
Quando se critica o capitalismo corre-se o risco de se ser imediatamente apelidado de comunista ou esquerdista radical. Como tem acontecido com o Papa Francisco, aliás. Ele tem-se limitado, no entanto, a denunciar o endeusamento do lucro e a defender os mais desfavorecidos da sociedade, em coerência com o postulado evangélico da opção preferencial pelos mais pobres.

A Doutrina Social da Igreja nunca pôs em causa a propriedade privada nem a livre iniciativa. Contudo, sempre foi crítica em relação à crença na sua autorregulação sem intervenção do Estado, do mesmo modo que sempre rejeitou a estatização da economia e de todos os bens.

Nos Atos dos Apóstolos é referido que nas primeiras comunidades todos os crentes viviam unidos e possuíam tudo em comum: “Vendiam terras e outros bens e distribuíam o dinheiro por todos, de acordo com as necessidades de cada um” (Act. 2, 44-45). Apesar disso, esse estilo de vida nunca foi imposto a todos os cristãos. Só alguns aderem a ele, de livre e espontânea vontade, em determinadas congregações religiosas, em que abdicam de possuir e tudo pertence à comunidade.

Fora desse contexto é permitido ter, mantendo todavia a preocupação das comunidades apostólicas para com os mais necessitados. Para os que nada possuem, o Papa tem reclamado o “direito sagrado” a ter trabalho, teto e terra. São direitos que na sua integralidade não são respeitados nem pelo liberalismo individualista, nem pelo comunismo coletivista. Logo, nem um nem outro são defensáveis à luz do pensamento social da Igreja.

O que o Papa tem criticado é o sistema económico em que “o capital se torna um ídolo” e em que “a avidez do dinheiro domina todo o sistema socioecónomico”, como disse na Bolívia. Tem apelado a dizer não “a uma economia de exclusão e desigualdade, onde o dinheiro reina em vez de servir”. Mas daí não se pode concluir que defenda um sistema, que, como a história demonstrou, para além de não garantir o acesso à propriedade privada, acaba por aniquilar as liberdades individuais.

Apesar de tudo, parafraseando Churchil, a economia de mercado é o pior sistema, excetuando todos os outros que foram experimentados. Sobretudo se, como propõe o Papa, for colocada ao serviço dos povos e não funcionar só em função do lucro.

(Texto publicado no Correio da Manhã de 24/07/2015)

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